O BERIMBAL
Morre Boa Voz da Capoeira
O Boa Voz da Capoeira! Seu nome de batismo é Sebastião Pelegrini de Mattos, nascido no dia 25 de setembro de 1959, na cidade de Petrópolis, filho de Leonídio de Mattos e Judith Pelegrini de Mattos, a dona Dith.
Ele vem de uma família com oito irmãos, sendo quatro homens e quatro mulheres, alguns falecidos por problemas de parto quando ele ainda era criança, tendo “vingado”, como se dizia à época, um homem (ele) e três mulheres. Conforme ele mesmo descreve, com sentimento de gratidão, sua infância foi muito feliz. Foi criado entre as irmãs e os primos, numa família descrita como “do mato”. Tiveram boa educação, mesmo com todas as dificuldades da época. Algumas passagens da sua vida o marcaram, como no então Ministério do Exército, atual Comando do Exército. Serviu no Pelotão de Comunicações, na função de Radioperador. Dessa passagem ele muito se orgulha, em especial, pela certeza dos bons serviços prestados à sua pátria e pelo amor que tem ao Brasil.
Outro período importante da sua vida foi em 1978, após dar baixa no Exército, quando treinou a arte marcial, Kung Fu Viet Vodao, uma novidade no Brasil, à época. Dessa arte marcial ele passou para a capoeira.
Em 1984 começou a acompanhar o trabalho do Mestre Camisa, Presidente-Fundador da Associação Brasileira de Apoio e Desenvolvimento da Arte Capoeira – ABADÁ-Capoeira, e, em 1985, começou a fazer parte da instituição, onde permanece até hoje. Com a capoeira ele já andou por todo o mundo, é conhecido também como “Caminhador” e ele gosta dessa definição.
Quanto à música, ele já era envolvido desde criança, seu pai era um músico natural. Assim ele também se define, bem como define seu filho Lucas Mattos, o Calu. Quanto ao gosto musical, ele se define como eclético, mas pela música da capoeira é um apaixonado, vem de dentro!
Vem de dentro o seu amor pela capoeira e afirma que, como também dizia Mestre Waldemar, está na capoeira não somente pela luta ou pelo atletismo, mas especialmente pela música, pois gosta muito de ouvir um berimbau bem tocado e um cântico bem entoado na boca de um bom cantador. Isso renova seu espírito e o mantém feliz!
Hoje tem apenas duas irmãs com ele, a Malvina e a Regina. A Blandina, chamada de Branda, com quem viveu até os seus 56 anos, já se foi. Foram e são grandes apoiadoras em sua vida. Por elas tem gratidão e profundo amor.
Tem a sua família constituída junto com Margô, sua esposa há quase 30 anos. Margô tem perfeita compreensão sobre sua situação e posição dentro da capoeira e o apoia em tudo. Ela é citada sempre com muito carinho pelo Boa Voz que fala que, quando iniciaram o relacionamento, Margô já sabia que o casamento incluiria também a capoeira em sua vida, pra sempre! Margô, é esposa, amiga, secretária, apoiadora, adjutora… Ela lhe presenteou com as maiores riquezas que poderiam ser concedidas, seus filhos Leonardo, mais velho, com 28 anos; Letícia, com 22; e Lucas, presente para a capoeira, seu companheiro de caminhada, hoje com 20 anos. Ele é grato por essa parte crucial da sua vida e fala do alto de sua sabedoria: – O que eu tenho foi Deus quem me deu!
Sobre as amizades que a capoeira lhe proporcionou, dentro e fora da Escola Abadá, ele não tem como enumerar. Ressalta: – Gente boa, corrente do bem! Ele diz que a capoeira precisa disso e a música vem justamente para reafirmar as suas melhores convicções: – Somos do bem, a capoeira é do bem e para o bem! Ele está feliz e grato por estar nesse meio, é grato às pessoas que conheceu na sua trajetória de vida e de capoeira, onde está há quase 40 anos. Diz que quer fazer 100 anos na capoeira e complementa: – Quem sabe? Maior é Deus, pequeno sou eu!
Sobre sua chegada ao trabalho do Mestre Camisa, afirma que a sua vida mudou totalmente como ser humano e especialmente como capoeirista. Que se não tivesse encontrado o Mestre Camisa, mesmo com todo o seu talento, seria um capoeirista e um cantador da capoeira com seus méritos, como já era antes de conhecê-lo, mas que não seria o Boa Voz. Ele tem muito a agradecer ao seu Mestre e sempre exalta: – A ele devo dinheiro, saúde e obrigação. Viva meu Mestre e a Escola Abadá!
Destaca duas pessoas e pede perdão aos demais amigos, que são muitos e seria impossível enumerar. Essas pessoas ele relaciona aos três irmãos de sangue com quem não conviveu, nem conheceu. Esses são os dois irmãos que a capoeira lhe deu, são da mesma época em que ele chegou na escola Abadá-Capoeira, conviveram e vivenciaram muitas situações juntos: Mestre Cobra e Mestre Morcego, a quem exalta, sem desmerecer os demais amigos que fez na sua caminhada.
É um dos instrutores da Escola e tem um trabalho com a música e o ritmo da capoeira, ministrando cursos pelo Brasil e pelo mundo. Lançou cinco CD’s e um CD-Book, que conta a história de algumas de suas cantigas. É considerado um dos maiores cantadores e compositores de capoeira de todos os tempos.
Faleceu ontem, 19 de abril de 2023, deixando um vácuo nas rodas de capoeira.