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O Violoncelo não é uma experiência, é uma dádiva

Heitor Dias é um talento jovem, com rara sensibilidade, pois além de psicólogo hospitalar e professor universitário em Medicina, é violoncelista e está concluindo a licenciatura em Música.

Criado em uma família musical, ademais da espiritualidade nos conceitos e exemplos de seus pais, Heitor vive o violoncelo em uma relação de integralidade. Não é só uma experiência musical, é ‘uma dádiva’ como ele diz, porque encontrou no ‘cello’ a transcendência e nele se realiza em sua face musical.

Heitor é professor no PIC-Programa de Iniciação Cultural, coordenador pedagógico de técnica e teoria. Sua orientação segura chega como diretriz para todos os envolvidos nos processos. Acompanha a professora Thalita Palão, nossa aluna avançada aqui da Sementear, já dando aulas de iniciação ao estudo do violoncelo infantil.

Perguntado por nós sobre sua atuação, vejamos um pouco do Heitor.

Sementear: Heitor, conte-nos a sua relação de amor com o violoncelo?

Heitor: Desde tenra idade o violoncelo ocupava meus sonhos e minha curiosidade: um instrumento que inspira nobreza, de timbre singular e profundo, além de incontestável beleza e versatilidade. Quando comecei a estudá-lo, não mais o deixei, exceto em períodos de convalescença. A Música é uma atividade cultural e humana, por isso creio ser impossível separá-la de uma formação integral. O violoncelo, por ser um instrumento tão próximo do ser humano – seu timbre é o que mais se aproxima de nossa voz – potencializa ainda mais esta aspiração por uma formação humana integral.

Sementear: Quais são os principais professores que fazem parte de sua formação musical?

Heitor: Devo minha formação a muitas pessoas. A começar por minha família, quem me proporcionou um precoce ambiente musical. Embora não tenha chegado a conhecê-la, minha avó materna, Profª. Dulce Sarmento, foi notável compositora, pianista, organista e pedagoga – importante personalidade de Montes Claros, minha cidade natal. Por influência dela minha mãe, Profª. Teresinha, dedicou-se ao estudo do piano e canto gregoriano. Meu pai, Dr. Ivan, por sua vez, atuou como violinista e professor do Conservatório daquela cidade. Meus estudos formais começaram com o violão erudito, na classe do Prof. Edson Sabino Silva, já na cidade de Uberaba-MG. Mais tarde, quando migrei para o Violoncelo, fui inicialmente orientado pelo Prof. Marcos Marçal. Depois, tive orientações dos Professores Kayami Satomi, Wagner de Lavos e Larissa Karling. Estudei apreciação e teoria musical com os Professores José Julio Stateri e Evelyn Toledo. Atualmente tenho o privilégio de ser aluno da classe do Professor Ilia Laporev, notável mestre, virtuose e violoncelista belga. 

Sementear: Como você vê o Curso de Introdução I ao Estudo do Violoncelo apoiado pelo PMIC-2022?

Heitor: A Sementear foi aprovada no Programa Municipal de Incentivo à Cultura – PMIC, promovido pela FAEC-Fundação Araguarina de Educação e Cultura, sob a direção do jovem Diogo Machado, edição 2022. Esse fato possibilitou o Curso Introdução I ao Estudo do Violoncelo, com duração de quatro meses para alunos iniciantes no instrumento. Como é sabido as políticas públicas culturais muito têm auxiliado o setor, proporcionando aos jovens a oportunidade de ter contato com o violoncelo e uma importante formação musical e humana.

Sementear: Destaque nos trabalhos das aulas algo que julgue oportuno valorizar na Sementear.

Heitor: A Sementear provê um fértil terreno para a formação dos alunos, fazendo jus ao seu nome. São crianças e jovens dedicados que prestam à Música e ao Violoncelo amor, entusiasmo e esperança. Já se destacam no cenário regional por suas apresentações, sempre marcadas por intensidade e emoção.

A aluna mais avançada do programa, Thalita, têm se destacado pelos seus estudos e pela sua atividade docente, orientando os alunos principiantes no desenvolvimento de uma sólida formação. Sou grato pela oportunidade de contribuir com o nobre projeto.

Sementear: Dos autores eruditos, quais o que vc destacaria e porque?

Heitor: É uma pergunta difícil porque exigiria uma visita à linha do tempo da Música. Para citar alguns poucos nomes, gostaria de mencionar a figura de Johann Sebastian Bach (1685-1750), nascido no Sacro Império Romano-Germânico (atual Alemanha) e por muitos considerado o maior Músico e compositor de todos os tempos – de fato, muito do que hoje compreendemos por Música se deve à sua magnífica obra. Curiosamente, esta ficou por um tempo esquecida, sendo resgatada por outro grande compositor, Felix Mendelssohn (1809-1847) e desde então seu prestígio não cessou de crescer. Nós violoncelistas temos particularmente uma grande dívida com Bach, pois devemos a ele a “Bíblia do Violoncelo”, isto é, as suas magistrais Seis Suítes para Violoncelo Solo”. Esta obra, por vicissitudes humanas, também ficou por um tempo esquecida, sendo redescoberta pelo grande violoncelista catalão Pablo Casals (1876 – 1973), um dos maiores nomes da história de nosso instrumento. Dada a transcendência e fecunda espiritualidade da obra de Bach, foi ele por alguns autores considerado “O Quinto Evangelista”. Sua Música pertence ao que os pensadores gregos chamavam de “Música das Esferas”, ou seja, que postula a existência de uma harmonia divina e matemática – portanto musical –  entre o macrocosmo e o microcosmo.

Não podemos deixar de mencionar outros grandes nomes: Ludwig van Beethoven (1770 – 1827), Johannes Brahms (1833 – 1897) – que junto com Bach são apelidados de  “os três ‘Bs’ da Música”.

A lista segue: Giovanni Pierluigi da Palestrina (c. 1525 – 1594), Sainte-Colombe (c. 1640 – c. 1700), Marin Marais (1656 -1728), Antonio Lucio Vivaldi (1678 – 1741), Arcangelo Corelli (1653 – 1713), Georg Friedrich Händel (1685-1759),Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), Franz Joseph Haydn (1732 – 1809), Frédéric François Chopin (1810-1849), Franz Liszt (Doborján, 1811 – 1886), Robert Schumann (1810 -1856), Clara Schumman (1819-1896), Franz Schubert (1797-1828), Antonín Leopold Dvořák (1841 – 1904),  Piotr Ilitch Tchaikovski (1840-1893)… A relação sempre será incompleta. No Brasil, considero importante ressaltar a obra do Padre José Maurício Nunes Garcia (1767 – 1830).

Sementear: Sua palavras finais.

Heitor: Sou grato pela oportunidade de prestar meu contributo à Sementear. Acredito que a Música é patrimônio de todos e não pode se restringir a uns poucos iniciados. Somos, por natureza, seres musicais. Por seu termo, o Violoncelo é um instrumento nobre e distinto (tocá-lo é uma dádiva) – creio firmemente que para além de suas grandes e impressionantes possibilidades musicais, ele é capaz de proporcionar ao instrumentista, quando bem direcionado, o desenvolvimento de valores e virtudes, isto é, também uma sólida formação humana. Assim, é um instrumento que permite transcender o ordinário e alcançar a Beleza – que, como escrevia Dostoiévski, tem o potencial de salvar o mundo.

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